Como passou rápido. Há dez anos atrás
o Brasil ainda surfava a onda das commodities, e nós acreditávamos que nada
mais nos pararia rumo ao futuro. Isso foi antes da grande crise do crédito
imobiliário americano, das crises das dívidas soberanas europeias, e de alguns
7 x 1 que sofremos nos campos da política/macroeconomia aqui pelo Brasil (o do
Mineirão seguramente foi o menor deles).
Eu, por minha vez, à época ainda um estudante
de economia na PUC do Rio tentava me situar no mundo (essa última parte ainda
não mudou de todo). Poderia contar alguma história bonita, mas a verdade é que
meu início no mercado financeiro foi atabalhoado, confuso, buscando me aproveitar
dos ganhos imediatos que os IPO`s ofereciam quase que semanalmente.
Numa época em que Eike Batista era o
rei da bolsa, e pouco se ouvia sobre Jorge Paulo Lemann, cada nova entrada de
uma empresa no pregão nacional era fonte de expectativa, e quase certeza de
lucro “rápido”. Como era fácil cair na armadilha de se sentir inteligente
naquela época...
Não irei aqui me alongar: para quem
não viveu aquele período, saiba que muita coisa mudou. Certamente, os próximos
dez anos nos reservam muitas surpresas, e viveremos num mundo diferente do que
habitamos em 2016. Vale a ressalva aqui: não tente adivinhar qual será a
próxima surpresa. Alguns até acertam, mas provavelmente não serão os mesmos que
acertarão a próxima. O ser humano não é dotado de poder preditivo.
No entanto, aprendi que, ciclos
econômicos a parte, algumas coisas simplesmente não mudam. E é justamente sobre
esses aprendizados que quero falar, em retrospectiva aos dez anos da minha
entrada no fascinante e caótico mundo dos investimentos. Não as encare como
verdades absolutas, dogmas a serem seguidos a ferro e fogo – pois não existe
tal coisa neste mundo. São, porém, somente a minha visão do que funcionou ou
não ao longo dos últimos dez anos.
1. Evitar
grandes erros > movimentos geniais
Seja cético ao analisar ações, procure
pelo básico. Enquanto muitas pessoas passam muito tempo procurando por grandes
casos de turn-around, olhe primeiro se a empresa apresentou indicadores consistentes de
rentabilidade nos últimos anos, se ela tem uma boa estrutura de
capital, liquidez razoável, etc. Muito difícil acertar a porrada da década. Por
outro lado, encontrar boas empresas a preços descontados com bons retornos de
longo prazo é mais fácil.
2. Simplicidade
> Complexidade
Operações mais complicadas como
derivativos e long x short podem ser feitas, desde que você saiba o que está
fazendo. Mas o que irá trazer o grosso do seu ganho de longo prazo, na verdade,
são coisas bem menos glamorosas como alocação de ativos ideal para você e um
controle rígido de custos transacionais.
3. Livros
> jornais
Jornais muitas vezes são escritos em
cima do evento, e jornalistas têm o péssimo hábito de procurar sempre por
causalidades espúrias. A tentativa de explicar em poucas linhas o porquê da
bolsa, universo permeado pela complexidade da interação humana, ter se
movimentado para cima ou para baixo é uma cilada para o investidor, pois pode levá-lo a acreditar
que entende as alavancas do mercado financeiro e assim conseguiria prever os
movimentos futuros. Ninguém tem esse poder. Nem Soros, nem Stuhlberger, muito
menos Buffett. Ninguém.
Livros, por outro lado, são escritos
em anos, pelas grandes mentes da humanidade, e, mais importante, sob a
perspectiva de anos – não de horas. Os bons escritores do mercado financeiro
têm a humildade de saber que, por mais preparados que sejam, a aleatoriedade
possui grande influência nos resultados de curto prazo, e o papel que nos cabe
é principalmente estarmos preparados para os diversos cenários: “heads I win, tails
I don't lose much”, diria Mohnish Pabrai.
4. Micro
> macro
Muito complicado interpretar os
movimentos macroeconômicos num mundo tão globalizado como o que vivemos hoje em
dia (apesar de em pleno 2016 ainda termos pessoas lutando contra essa
realidade). Quando juntamos a esse cenário as questões políticas, se torna uma
missão quase impossível. De cabeça consigo lembrar de poucos notáveis como
Soros, Druckenmiller e Stuhlberger. Muito mais fácil, portanto, formar um
patrimônio através da análise dos fatores microeconômicos, ou seja, o que afeta
o desempenho econômico-operacional das ótimas empresas às quais você pode se
associar pelos próximos anos.
5. Risco
> volatilidade
A essa altura já deu para perceber que
o foco dos meus investimentos foi orientado para resultados em anos, não em
meses ou semanas. Sendo assim, faria sentido usar a volatilidade de uma ação em
relação à média do mercado (que os chamados “experts” logo batizaram de beta)
como uma medida de risco para aquela empresa?
Uma maior variação da cotação no
mercado acionário pode-se dever a inúmeros motivos, entre eles o meu
preferido: os agentes da bolsa ainda não entenderam exatamente como “funciona”
aquela empresa. E isso é ótimo, porque se você se dedicar a entender sobre
aquela empresa, o Mr. Market pode lhe oferecer ótimos descontos para se tornar
sócio de uma excelente companhia.
Por outro lado, existem inúmeros casos
de ações ditas estáveis, que pouco oscilam na bolsa, que, de uma hora para
outra, quebram ou veem o setor em que atuam apresentar alguma mudança estrutural
capaz de jogar seu preço para baixo de forma tão rápida que nem o mais ágil
operador será capaz de evitar perdas definitivas em seu patrimônio.
6. Análise
qualitativa > análise quantitativa
Quem já leu posts anteriores desse
blog sabe que os números de uma empresa, como ROIC, EV/EBIT, crescimento
entre outros são sim bastante importantes para a análise. Entretanto, números
não são suficientes se seu objetivo é tornar-se sócio num negócio pelos
próximos anos ou décadas.
Você não quer entrar numa empresa
lucrativa e barata, mas com um sócio majoritário que rouba o caixa ao fim do
mês ou mesmo está associado a crimes ambientais, quer? Ou ainda, se associar a
uma empresa que até está indo bem no momento, com bons resultados trimestrais,
mas que você sabe que não tem qualquer barreira para se diferenciar dos
entrantes que fatalmente irão “roubar” parte significativa desses lucros?
7. Longo
prazo > curto prazo
Se você acompanha esse blog já devia
imaginar que esse item não poderia faltar. O curto prazo é um universo onde
quase todos os agentes do mercado habitam. Muito mais empolgante, pois é
recheado de ação e muita emoção. O que não se demora a perceber é que as
operações de curto prazo são fortemente guiadas pela aleatoriedade em função da
complexidade inerente aos mercados financeiros.
Já no longo prazo a
concorrência se reduz bastante. Menos animada, pois exige que você fique meses
ou anos a fio sem nenhum movimento espetacular. Você escolhe as empresas que
atendem a seus critérios e senta sobre as mãos. No longo prazo o mercado costuma
premiar as melhores ações, enquanto que no curto prazo o que move as ações são os fluxos de capitais. Ou seja, se você está se divertindo na Bolsa,
meu amigo, sinto dizer que você está fazendo alguma coisa errada.
8. Menos
> mais
Demorou alguns anos para que eu
aprendesse que eu não preciso ser a pessoa mais ativa do mundo para obter
resultados satisfatórios com meus investimentos. Durante anos ouvi de diversas
pessoas: “não invisto na bolsa pois não tenho tempo de acompanhar o mercado”.
Nada mais errado. Você é pago na bolsa por fazer algumas poucas escolhas
certas, evitar várias erradas e depois esperar o efeito dos ganhos compostos ao
longo dos anos. Ficar olhando os movimentos diários das cotações, se
movimentando em reação a esses movimentos aleatórios do bipolar Mr. Market,
aumentam as chances dos erros pois você fatalmente estará agindo pelo calor de
alguma emoção.
9. Temperamento
adequado > habilidade
Como disse certa vez Warren Buffett,
não é necessário ter um QI de 180 para obter sucesso na bolsa. Por outro lado,
se você não tiver o temperamento adequado, ou seja, não conseguir sentar sobre
suas mãos e esperar pacientemente ao longo de anos as empresas às quais você se
associou darem resultados consistentes, então terá sérios problemas. Acertar a
melhor empresa, com os melhores fundamentos, não adiantará nada se no momento
em que ela subir 5%, você “realizar o lucro” (argh). Certa vez li uma frase que
conseguiu resumir muito bem essa ideia: “Tempo na bolsa é mais importante do
que acertar o tempo da bolsa”.
10. Experiência
> Estudo formal
A melhor forma de aprender na bolsa é
investindo, praticando. Bolsa é muito mais arte do que ciência. Isso quer dizer
que nem sempre o que deu certo para determinado investidor de sucesso dará para
você. O autoconhecimento tem papel fundamental nesse sentido, e isso,
infelizmente, não se aprende numa sala de aula.
Não estou aqui pregando que não se
deve estudar, longe disso. Estou dizendo somente que, reconhecendo o valor do
ensino formal, estudo sem prática não leva a muito longe, pois não envolve as
emoções humanas inerentes às incertezas as quais todos estamos expostos na
bolsa.
“If
your goal is to beat the market, an MBA or a Ph.D. from a top business school
will be of virtually not help.” Joel
Greenblatt
Conclusão
Vale ressaltar: essas são tão somente
as minhas percepções do que funciona no investimento em bolsa no Brasil, mas
não tenho a pretensão de ser o dono da verdade. O verdadeiro aprendizado é que
náo importa o estágio de desenvolvimento em que estamos, o mais importante é
manter sempre a humildade frente o desconhecido. Saber que há muito por
aprender, e, principalmente, entender que há ainda muito mais que simplesmente
não podemos saber antes dos eventos ocorrerem. Essa é a verdadeira sabedoria.
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