quarta-feira, 27 de julho de 2016

Decisões, não resultados


Geralmente, quando um investidor tem um ano bom na Bolsa, atribui o sucesso a sua capacidade de analisar ou prever o mercado. Explicações de como alcançou este resultado não lhe faltam. Caso o resultado não venha conforme o esperado, não raro ouvirmos desse mesmo investidor o argumento de que “o mercado é irracional, ineficiente, voting machine”, etc. 

Portanto para atingirmos retornos consistentes, é mandatório ter mais acertos que erros no curto prazo? Não necessariamente. Claro que ter uma sequencia boa de acertos traz uma sensação boa. Quem está ganhando dinheiro se torna mais confiante na sua capacidade de bater o mercado. O problema é que, sem uma boa gestão de risco, o excesso de confiança somado a alguns dias ruins podem ser capazes de destruir todo o retorno acumulado. 

Então a melhor estratégia seria ir sempre contra a maioria? Também não. Na maior parte do tempo o consenso está certo. No Brasil, a aplicação em dólar e renda fixa foram posições de consenso nos últimos anos que geraram ótimos retornos. Além disso, estar errado com frequência no curto prazo pode afetar o ânimo do investidor, atrapalhar sua capacidade de manter a disciplina e a racionalidade.


Não engane a si mesmo 

Investir pode ser simples, mas não tem nada de fácil. Além da complexidade de analisar diversos fatores nas esferas micro e macro, é preciso admitir a existência de um outro fator que não está em nossas mãos, como nos dizem dois grandes pensadores do mercado financeiro:

"Não há dúvida de que trabalho duro, planejamento e persistência são essenciais para o sucesso. Mas mesmo o investidor mais esforçado e o melhor tomador de decisão não terá sucesso sem sorte”.   Howard Marks
“O mundo é um lugar incerto, até mesmo aleatório. O que "deve acontecer" pode estar totalmente claro, o que significa nós sabemos o que o futuro nos reserva. Mas as coisas que devem acontecer podem não acontecer - e outras coisas podem acontecer em seu lugar - por uma variedade de motivos, muitos deles estranhos, imprevisíveis ou mesmo sem sentido. Esses acontecimentos podem ser descritos como aleatórios: o resultado de sorte, boa ou má.”  Nassim Taleb


Não se engane: a qualidade de uma decisão não pode ser julgada somente por seu resultado. Por causa da aleatoriedade no mundo e a consequente imprevisibilidade acerca do futuro, decisões erradas podem levar a bons resultados, enquanto inúmeras boas decisões terminam em fracasso.

No mercado financeiro se já é difícil saber o que vai acontecer a seguir, é tarefa impossível prever quando determinado evento irá se concretizar. Muitos fatores influenciam o desempenho além de (a) trabalho duro e habilidade e (b) desconto do mercado sobre as informações sobre o futuro. A sorte - aleatoriedade, ou a ocorrência de coisas fora do nosso conhecimento e controle - desempenha um papel enorme nos resultados.


A origem do sucesso no pôquer e na Bolsa

Ao estudar os traços comuns dos mais bem sucedidos em jogos de habilidades - em variadas disciplinas - pesquisadores descobriram uma clara tendência em se concentrar mais no processo do que nos resultado final. O multicapeão de pôquer, o americano Amarillo Slim, descreveu a origem de seu sucesso desta forma: "o resultado de um único jogo não significa por*** nenhuma. Por isso que um dos meus mantras sempre foi `decisões, não resultados`". Repita o processo certo ao longo dos tempos e os resultados em longo prazo cuidarão de si.
 

O sucesso nos investimentos não vem apenas de se acertar a carteira ideal, as ações certeiras, depende também de encontrar um ambiente favorável. Assim ser bem sucedido no curto prazo requer sim um grau significativo de sorte. Ninguém acerta o tempo todo. A diferença é que o investidor hábil estará certo mais vezes, durante um longo período de tempo, do que o suposto num cenário de aleatoriedade pura. É por isso que mesmo os melhores investidores diversificam, fazem hedge e limitam o uso de alavancagem. 

O diferencial de um bom investidor está na capacidade de reconhecer seus erros - independente dos movimentos de mercado - mudar de opinião quando os fundamentos se alteram e, acima de tudo, manter a convicção em seu processo decisório quando os preços andarem em direção oposta ao esperado.


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